quinta-feira, 2 de agosto de 2007

IMAGEM 1

Ele estava num barquinho, em alto mar. Há tempos cortara a corda da âncora, e divertia-se lhe arrancando uns pedaços, até que restasse apenas o mínimo necessário pra que continuasse boiando. Estava navegando pelo oceano imenso em um pedaço de madeira que restara, e era somente o espaço certo para seus pés. Em meio ao oceano imprevisível em sua fúria, em sua calmaria. Numa tempestade longa e passageira, em seu pedacinho de madeira equilibrando-se, avistou um navio, imenso e calmo, em sua segurança continental. Por uma onda, foi arremessado pra junto dele, e havia uma corda pendurada no casco imenso. A corda grossa e segura. Olhou pro pedaço seu de madeira embaixo dos pés, e decidiu pendurar-se à corda do navio. Agarrou-a então junto ao corpo com toda a força que lhe restava, e sentiu-se calmo, vendo o seu pedacinho de barco perder-se no oceano. Quando este sumiu nas águas, reparou que a força que tinha de fazer pra manter-se preso à corda era imensa, e que seus músculos estavam cansados. O navio, que de longe parecia calmo e sereno, olhando assim tão de perto, percebia-se que balançava muito, de um lado pro outro, mais até que o resto do seu barquinho que se fora. E, a cada vez que pendia para o seu lado, ele submergia nas águas muitos metros juntamente com o casco gigantesco. Estava afundando, aos poucos, e, em seu demorado naufrágio, o navio engoliria juntamente consigo todos que estivessem à sua volta; puxados pro fundo pela sua massa imensa, inclusive ele, pendurado na corda. E agora só lhe restara largar a corda rapidamente, nadar muito até distanciar-se dali, e, quem sabe, reencontrar então aquele pedacinho de barco, ou algum dos outros dantes arrancados, para boiar novamente com leveza e deixar-se levar pela superfície do oceano, sem a segurança de navio, mas sem o seu afundar-se lento e inevitável. O nome desse navio poderia ser o de um retrato de mulher.

2 comentários:

Pensamentos Inconvenientes disse...

Eita Mundão imenso e incerto....

respiros entre tormentas e calmarias.

Anônimo disse...

a gente naufraga junto com ele.
a gente naufraga também sozinhos nas nossas proprias histórias, por razões diversas. Desnecessário fechar com a imagem do "retrato de mulher".
Muito bom.