quinta-feira, 10 de julho de 2008

Os cabelos da Nona, o sol no chão.

Ou será que há somente os antes e os depois – só que são feitos de agoras inflacionados. O que não existe então é o tal do durante. Pensava enquanto cozinhava batatas e o chão da cozinha refletia o sol que era como o do chão da cozinha onde a Nona cozinhava batatas para o purê. Agora ele esperava batatas para um purê que tentaria refazer como o da Nona e pensava sobre os cabelos dela, como é que eram sempre iguais. Esperando para amassar as batatas com seus cabelos desiguais e a água fervia com as batatas e o sol no chão. Depois tocou a campainha. Agora vou até a porta, mas antes preciso despedir-me dos cabelos da Nona e do sol e do purê para encontrar um outro ser humano que me espera. Eu gostaria de poder ficar um pouco mais aqui vendo essa fumaça esperando as batatas, mas há um outro ser humano na porta. Eu a estava esperando e algum tempo atrás reclamava do seu atraso; agora já me havia acostumado. Não consegui despedir-me da Nona e a campainha de novo Nona vamos comigo até a porta. Não gosto disso porque depois ela vai embora sem avisar e quando vejo não está mais e estou eu e um outro ser humano enfiados no durante. De novo a campainha. Avisto-a no portão e agora a apresento à Nona e agora não há durante com este ser humano pois ela é também tudo o mais como o vapor da panela e o sol no chão e agora ela sorriu e posso sentir-me nela como dentro daquela cozinha como esperando as batatas da Nona que pode ficar por aqui por que já são conhecidas e têm do que conversar, as duas. Ela o abraça e ele sente o cheiro do seu perfume que é como um cheiro que existe em algum lugar em algum canto de alguma casa onde vivera. Ela não quer parar de abraçá-lo e nem ele, e ela sente as mãos dele que a apertam como as mãos de um outro homem que ela lhe apresenta neste momento, mas os dois já são amigos de longa data. Ela lhe beija o pescoço que tem o cheiro duma rua por onde já passara, mas da qual já não mais se recordava.

Um comentário:

Petra Costa disse...

que gostoso esse durante que você nos proporcionou há alguns segundos atrás que logo se tornaram minutos e já vem o medo de esquecer o quão bom foi ler e de me perder nessa infinitude de palavras e rostos... queria pedir para a Nona me acompanhar com a fumaça de suas batatas agora que eu fecho essa tela já que a biblioteca aqui fecha